O arcabouço teórico que dá origem ao modelo padrão é a Teoria Quântica de Campos (TQC) Relativísticos, que é a teoria quântica de sistemas sujeitos à relatividade restrita. Nesta teoria, somos forçados a redefinir o conceito de partícula, desta vez relegando-o a um papel derivado. Na TQC, em razão da relatividade restrita redefinir as simetrias fundamentais do espaço e do tempo, já não é possível considerar que as partículas são eternas e indestrutíveis. De fato, a criação e aniquilação de partículas e
anti-partículas foi descoberta como elemento fundamental da TQC já na década de 1930. Ainda consideramos que as partículas elementares são adimensionais, mas a origem dessas partículas, em oposição à ideia clássica que os posiciona como atores independentes em um palco euclidiano pré-definido, é severamente distinta. Na TQC o espaço-tempo e suas simetrias fundamentais (tranlações, evolução temporal, rotações e boosts de Lorentz) determinam quais são as partículas permitidas pelo nosso Universo, portanto, o palco ainda é fixo, mas os possíveis atores são definidos pelas propriedades de simetria do espaço-tempo.
Claramente, não é possível que toda a física dependa da TQC para ser compreendida. Isto ocorre porque os fenômenos naturais na escala humana de tamanho e energia são complexos demais para ser explicados com quarks, glúons e léptons. A realidade objetiva permite a descrição através do modelo padrão apenas nos grandes aceleradores de partículas, que alcançam as energias necessárias para que esses objetos possuam relevância. Assim, embora saibamos que a matéria seja fundamentalmente descrita pela tabela \ref{826089}, esta não é a descrição que utilizamos para fenômenos atômicos e moleculares, para a química, para a biologia, ou mesmo para a mecânica dos corpos macroscópicos, nosso interesse de estudo.
Hoje, sabemos que o conceito fundamental de partícula já não suporta a definição newtoniana, dada a existência de fenômenos que nos obrigam a abrir mão deste conceito em favor de outros mais adequados. Contudo, dentro do arcabouço da mecânica clássica, a partícula newtoniana é um conceito fundador e, até certo ponto, suficiente para a definição de uma realidade objetiva, ainda que limitada.
Assim, as características definidoras de uma partícula, ou seja, seus observáveis intrínsecos, trazem o conceito de partícula à realidade objetiva pois dois observadores quaisquer devem concordar com a medida destes observáveis. É o caso já mencionado da massa, da carga elétrica e do spin. Além desses observáveis, devem existir observáveis extrínsecos, responsáveis por descrever outras características do sistema físico. Se nos atermos à regra de que cada observável possui um objeto matemático correspondente, devemos nos perguntar quais estruturas matemáticas podem ser definidas de modo a satisfazer o critério de realidade da teoria. E, como vimos, ao menos por enquanto, tal critério de realidade está ligado à homogeneidade e isotropia do espaço euclidiano.
Como definir os observáveis?
Um observável representa uma característica do sistema físico que pode ser medida por um observador. O que define sua realidade física é a invariância da medida com relação a determinadas classes de referenciais. Vamos definir essas classes mais adiante. Mas por enquanto, desejamos que dois observadores rotacionados entre si concordem com as medidas que obtêm dos observáveis. Portanto, objetos definidos pela simetria de rotação devem compor o conjunto de observáveis físicos da mecânica clássica. Como vimos, a distância entre dois pontos, que define a forma geométrica de corpos no espaço, é um desses objetos. Matematicamente, há um forma rigorosa de se definir estes observáveis, usando Teoria de Grupos e Representações. Isto está, contudo, fora de nosso escopo. Abaixo, apenas discutirei quais seriam os objetos matemáticos bem definidos segundo essas simetrias.
Funções escalares
O primeiro objeto bem definido pelas simetrias do espaço euclidiano é a função escalar. Uma função escalar \(f\) é uma função que leva pontos de \(\mathbb{R^3}\) em números reais, o que descrevemos matematicamente por \(f:\mathbb{R^3}\rightarrow\mathbb{R}\), ou seja, o domínio é todo o conjunto dos pontos no espaço, e o contra-domínio é a reta real. São as funções de três variáveis que estudamos em Cálculo. No geral, escrevemos a função como \(f=f\left(x_1,x_2,x_3\right)\), ou seja, como uma regra que relaciona três números reais a um único número real.
Contudo, para que uma função seja uma função escalar, precisamos de mais uma regra. Suponha que um sistema de coordenadas \(\left\{x_1,x_2,x_3\right\}\) seja rodado para o sistema de coordenadas \(\left\{y_1,y_2,y_3\right\}\) por uma matriz de rotação \(R\). Esperamos que uma mudança no sistema de coordenadas mude a regra de relação que definie a função, além da denominação do ponto do domínio. Contudo, vamos apenas selecionar as funções que não se alteram diante de uma rotação. Assim,\[x\rightarrow y=Rx \ \ \implies \ \ f\left(x\right)\rightarrow f'\left(y\right)=f\left(x\right).\]Isto quer dizer que a função rodada no ponto transformado precisa ser igual à função original no ponto original, portanto, funções escalares são invariantes por rotações.